Projeto Rio Silveira

Instituto de Geociências (UNICAMP)

Projeto Rio Silveira

A IMPORTÂNCIA DA ERVA-MATE PARA O POVO GUARANI

Texto produzido por Vicente Eudes Lemos Alves

Aerva-mate possui galhos com folhas verdes, brilhantes, lisas, duras, com curvaturas vistosas e suavemente dentadas em suas bordas em forma de cunha. As cores e o tamanho são distintos, dependendo de sua variedade e de suas condições de desenvolvimento. Às vezes a sua estrutura se caracteriza como uma grande árvore e em outras um modesto arbusto. O tronco é acinzentado, quase branco, povoado de líquens e musgos, em alguns casos se ramifica desde a base, e em outros desenvolve um único caule de amplo diâmetro, ramificado profusamente na copa.

Ilustração em aquarela: Kyo Dias

Essa planta é natural de toda a bacia do Rio Paraná, com abrangência em áreas do Brasil, da Argentina, do Paraguai e do Uruguai, lugares onde ocorre concentração do povo Guarani, apresentando grande importância para esse povo, com uma relação histórica e cultural muito próxima. É chamada pelo povo Guarani de ka’a, que significa planta, árvore ou floresta. Isso define bem a importância que possui para eles, porque ela não representa apenas uma simples planta, mas significa o poder que possui frente às outras espécies vegetais da mata.

O elevado consumo da erva-mate como alimento e para rituais pelos Guarani e outros povos habitantes da bacia do Rio Paraná contribuiu para o desenvolvimento de diversas atividades econômicas e difusão dos usos dessa planta.

A erva-mate é bastante aproveitada para o uso alimentar pelos Guarani principalmente porque possui propriedades antioxidantes e estimulantes que ajudam nas funções terapêuticas e no desempenho físico das pessoas. Além disso, é bastante difundido nos costumes desse povo o uso do mate para rituais religiosos e para outros tipos de comunhão entre as pessoas, por isso, os Guarani fazem historicamente uso da erva-mate em suas manifestações religiosas. Tomar a erva ou queimá-la antes de um ritual confere um momento sagrado, na medida em que possibilita o contato e o agradecimento pela generosidade da força divina de Nhanderu, sendo ela representada pelo poder da água, do relâmpago e de todas as outras coisas do universo.

Na cultura Guarani o ato de beber o mate significa também estabelecer a união entre as pessoas e repartir momentos em comunidade. Nesse sentido, é comum o consumo da erva em reuniões sociais nas quais se ocorre o compartilhamento entre as pessoas da cuia e da bomba. Para essas ocasiões não se estabelece distinção entre os indivíduos, não existem barreiras sociais e culturais entre eles, mas, sim, o fortalecimento dos laços entre os parentes e os amigos. Estes atos fortalecem tanto as alianças quanto à reciprocidade sociais e a vida em comunidade.

Dessa forma, considera-se que a longa história de convivência do povo Guarani com a erva-mate permitiu estruturar as formas de vida desse povo em diversos sentidos. Isso significa que preservar a ka’a representa também a manutenção os costumes Guarani.

Através do uso da bomba fica explícito o fato do compartilhamento de um valor que se revela fundamental para o Guarani, que baseia sua vida segundo o princípio de reciprocidade, sinalizando a essência de sua cultura. A riqueza é avaliada não segundo o que os indivíduos possuem em maior ou menor quantidade de bens materiais, mas naquilo que demonstre uma melhor disposição para o compartilhamento. Por essa razão, tanto a sobrevivência quanto o pleno desenvolvimento da comunidade sempre estiveram acima das individualidades.

As relações entre os Guarani e a erva-mate são numerosas e diversas, sendo uma delas a afinidade entre a sólida estrutura social afirmada sobre laços de parentesco e de reciprocidade, e a forma pela qual crescem os ervais na terra. A vida em comunidade representa, nesse sentido, a aliança entre seus indivíduos e a capacidade para manter-se e conservar-se como grupo. Essas características são comuns ao povo e sua relação com os ervais que crescem livres na mata.

REFERÊNCIAS

NAVAJAS, Pau. Caá pora’í el espíritu de la erba mate. 1ª. Ed.-Buenos Aires: Establecimento las Marias, 2004.

SAIBA MAIS

Realização: Participantes do Ponto de Cultura “Arandu Porã”
Produção: Centro de Trabalho Indigenista / Comunidade Guarani do Ribeirão Silveira

Documentário produzido pelos participantes das oficinas de formação audiovisual do Ponto de Cultura “Mbya Arandu Porã”, sediado na aldeia Guarani Ribeirão Silveira. O ka’a’i, ritual da erva-mate, é realizado todos os anos como uma celebração da chegada do Tempo Novo (Ara Pyau). É um dos momentos em que os guarani reafirmam os laços com seus ancestrais divinos, os Nhanderu Kuery, e pedem para que sejam fortalecidos.