Projeto Rio Silveira

Instituto de Geociências (UNICAMP)

Projeto Rio Silveira

PROCESSO DE DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA RIO SILVEIRA

Texto produzido por Rafael Modesto e Eduardo Bernardo dos Santos

Localizada numa pequena faixa de terra entre a Serra do Mar e o oceano Atlântico, a Terra Indígena Guarani Rio Silveira conta com aproximadamente 474 habitantes, distribuídos em uma área de 944 hectares, entre os municípios de Bertioga, São Sebastião e Salesópolis, no Estado de São Paulo.

Atualmente a comunidade da Rio Silveira tem como principal fonte de renda a venda de seu próprio artesanato, e, além do comércio, a população da aldeia se dedica ao cultivo de pequenas plantações, bem como à pesca e à coleta de alimentos.

Com o passar das gerações, o modo de vida dessa população vem se alterando significativamente, principalmente no que tange aos seus rituais religiosos e ao uso do território, o que significa um intenso processo de descaracterização de sua cultura, através do esfacelamento progressivo de seus conhecimentos, tradições e valores.

O crescimento urbano ocorrido no litoral norte do estado de São Paulo, principalmente a partir da construção da Rodovia Rio-Santos (BR-101), na década de 70, acarretou no aumento dos empreendimentos imobiliários e no número de turistas, reduzindo expressivamente o espaço ocupado pelos Guarani.

Apesar da existência de alguns mecanismos de preservação da cultura – incluindo a prática da língua original no cotidiano da aldeia – o contato prolongado com os não-indígenas acarreta irreparáveis perdas à tradição Guarani, devido à modificação dos costumes e crenças seculares desse povo, além da elevada taxa de mortalidade registrada nas últimas décadas, provocadas por esta proximidade.

Por isso, a demarcação da terra para os povos indígenas toma preponderância na proteção dessas populações, no sentido de salvaguardar os direitos originários dos Guarani em relação ao seu modo de vida e ao uso do território. Nesse sentido, em 1987, através do Decreto Presidencial 94.568, regularizou-se, pela primeira vez, os limites territoriais da Rio Silveira.

Esta demarcação inicial, feita de modo arbitrário, estabeleceu a área de residência atual dos Guarani sem base em qualquer avaliação histórica ou antropológica. Tal delimitação foi perpetrada de modo enviesado, levando em consideração apenas interesses econômicos locais, em detrimento da ocupação indígena real, cuja abrangência é maior do que a delimitação imposta pela presidência à época.

A Fundação Nacional do Índio (FUNAI), amparada pelo artigo 231 da Constituição Federal de 1988, deu início ao processo de demarcação da Terra Indígena Rio Silveira, em 2000. Realizou-se um estudo antropológico, segundo os critérios estabelecidos pela própria FUNAI, para a delimitação da área destinada aos indígenas.

Esse estudo foi finalizado no ano de 2002, porém, somente em 2008 o Ministério da Justiça autorizou, por meio da Portaria 1.236, a demarcação física da aldeia Rio Silveira. Esta se deu através da “materialização dos marcos e georreferenciamento”, conforme o exposto na página “Modalidades de Terras Indígenas” no endereço eletrônico da FUNAI na internet.

Resultado de uma luta que se estende desde a década de 1940, a demarcação da Terra Indígena Rio Silveira é um importante dispositivo jurídico que respalda constitucionalmente o direito histórico do povo Guarani ao território. Contudo, os esforços continuam, dessa vez voltados para a ampliação da área da aldeia, dos atuais 944 hectares, para 8.500 hectares. O processo está em tramitação judicial desde 2010 e até hoje não foi concluído.

Você sabe como uma Terra Indígena é demarcada?

A demarcação das Terras Indígenas é um processo administrativo que busca identificar e sinalizar os limites dos territórios ocupados tradicionalmente pelos povos indígenas, por meio do qual diversos órgãos públicos atuam, como a FUNAI, o INCRA, o Ministério da Justiça e a Presidência da República. Dessa forma existem alguns tipos de Terras Indígenas:

  • Terras Indígenas tradicionalmente ocupadas: são as terras habitadas pelo nosso povo, na qual fazemos uso das riquezas do solo, dos rios e dos lagos, além da preservação dos nossos costumes e tradições. São aquelas já ocupadas por um ou mais povos indígenas.
  • Reservas indígenas: são terras indígenas doadas por terceiros, adquiridas ou desapropriadas pela União, destinadas à posse permanente de um ou mais povos indígenas. As reservas são criadas para o assentamento de povos indígenas que vivem em locais que estão sofrendo algum impacto, seja por conflitos internos ou pela construção de grandes empreendimentos.

  • O processo de demarcação envolve algumas etapas. O primeiro passo que o Estado dá se refere ao estudo da área ser demarcada, analisando a história, a cultura, a cartografia, a antropologia e o meio ambiente. Esses fatores influenciam na delimitação da terra indígena. Após a análise e aprovação desses estudos a terra passa a ser considerada Terra Indígena Delimitada, avançando-se para a próxima etapa, a de declaração. A Terra Indígena Declarada está autorizada a ser demarcada fisicamente onde a área da Terra indígena é definida com o uso de equipamentos cartográficos. Após a demarcação da área, esse documento é encaminhado à Presidência da República esperando a aprovação. Quando aprovado, a terra indígena passa a ser homologada e finalmente registrada como terra indígena regularizada.

    Por que a demarcação das Terras Indígenas é importante?

    A importância da demarcação das terras do nosso povo está ligada à preservação da nossa identidade como indígenas e à proteção das nossas crenças, costumes, tradições e território. Mas, além disso, a demarcação assegura um direito muito maior para todos os brasileiros, que é a construção de uma sociedade diversificada, com uma grande quantidade de etnias e culturas, respeitando as características individuais de cada povo. Desse modo podemos garantir a proteção do patrimônio histórico e cultural brasileiro.

    REFERÊNCIAS

    FUNAI. Fundação Nacional do Índio. Modalidades de Terras Indígenas. Acesso em: 23 de junho, 2020.

    Informações sobre o processo de ampliação da aldeia. Acesso em: 23 de junho, 2020.

    ISA. Instituto Socioambiental. Informações sobre a Terra Indígena Rio Silveira. Acesso em: 23 de junho, 2020.

    SANTOS, E. B. dos, et al. Espaço vivido e espaço legal na Terra Indígena Ribeirão Silveira (Tekoha Murutï): reflexões a partir da cartografia participativa em sala de aula. In: VII CONGRESSO BRASILEIRO DE GEÓGRAFOS, 7., 2014, Vitória. Anais… Vitória: AGB, 2014.