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Considerações sobre o terremoto na Turquia/Síria, pelo geólogo Eduardo Salamuni

“A região é sísmica e possui falhas geológicas ativas, isto é, concentram tensão e a liberam em forma de ondas de choque que resultam em terremotos de magnitudes variadas. As ondas movimentam o solo tanto no sentido lateral quanto vertical e, potencialmente, derrubam as construções que não suportam esse tipo de instabilidade.”


“O terremoto de ontem foi um evento de grande magnitude (7,8 na escala Richter), seguido de terremotos “filhos” ou secundários. O mais forte terremoto secundário teve uma magnitude muito forte também (7,5 na escala Richter). Esses terremotos secundários são normais em eventos sísmicos. Foram os maiores eventos ao longo de 100 anos de monitoramento.
Vale a pena conhecer as causas de maneira um pouco mais aprofundada.”


“A região coloca em contato a Placa Arábica, localizada na região sul-sudeste e a Placa Euroasiática, a norte-noroeste. Porém entre estas placas há um bloco menor (microplaca) denominada de Placa de Anatólia, que é limitada por duas grandes falhas (veja imagens abaixo). São as falhas de Anatólia Norte e Anatólia Leste, ambas consideradas zonas sísmicas de grande risco (veja a quantidade de tremores ao logo de uma das falhas na imagem abaixo). Seu mecanismo e geometria são semelhantes à Falha de Santo André em Los Angeles (EUA).
Este tipo de falha é chamada de transformante, cuja descontinuidade (ou plano de falha) é praticamente vertical, e seu movimento é direcional, ou seja, os blocos justapostos se movimentam de maneira oposta. No caso da Falha Anatólia Leste, explicando de modo simples, a Placa de Anatólia se desloca no sentido sudoeste e a Placa Arábica se desloca para nordeste, determinando um movimento (ou cinemática) anti-horário
O hipocentro se deu a uma profundidade de 24 km, mas atingiu fortemente a superfície a tal ponto que criou um deslocamento (chamado em geologia estrutural de rejeito) de 3 metros ao longo da ruptura principal, ou seja, parte substancial dos terrenos foi deslocada essa distância (3 m) de um ponto a outro de forma instantânea! O terremoto secundário foi fortíssimo também, deslocando o terreno cerca de 10 m, segundo estimativas preliminares.”


“Esse processo geológico, que chamamos de tectônica ativa, ou neotectônica, tem sido muito estudado a fim de se buscar uma maneira de como prever os terremotos. Até o momento, porém, não possuímos tecnologia ou método para tanto. Sabemos onde estão as falhas ativas, sabemos que possuem risco sísmico quantificável, sabemos que estão sob tensão, mas não temos condições de precisar a data e o local do próximo evento sísmico.”


“Quanto mais estudamos mais respostas teremos, mas enquanto esse momento não chega é preciso que as construções estejam minimamente preparadas para suportar as ondas de choque e que possibilitem, ao menos, o tempo necessário para a fuga dos residentes.
Infelizmente não foi o caso das cidades no entorno da região – estejam na Turquia ou na Síria – que não possui infraestrutura adequada e está em permanente conflito social. Isso certamente vai agravar, ainda mais, o quadro de destruição provocado pelo terremoto, assim como foi o caso do Haiti, que até hoje não se recuperou do grande terremoto ocorrido em 2010.”


“Só nos resta torcer para que a quantidade de mortos e feridos seja menor que as estimativas.
RIP às vítimas, sorte e resiliência aos países e cidades afetadas!.”


Eduardo Salamuni é Graduado em Geologia pela Universidade Federal do Paraná (1986), Mestre (1991) e Doutor (1999) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP. Professor Associado IV na Universidade Federal do Paraná nos Cursos de Graduação e Pós-Graduação de Geologia, nas disciplinas de Geologia Estrutural, Tectônica Global e Neotectônica. Suas linhas de pesquisa estão concentradas em Análise Estrutural, Tectônica e Neotectônica com abordagem sobre a tectônica cenozoica e neotectônica da região sul do Brasil; a morfoestrutura e a morfotectônica da Serra do Mar e análise de falhas no pré-Cambriano do Paraná. Foi Diretor Presidente da MINEROPAR / Serviço Geológico do Paraná (de 2003 a 2011), foi Chefe do Departamento de Geologia da UFPR (de 2013 a 2016) e atualmente exerce o cargo de Coordenador do Planejamento Institucional da UFPR. Publicou, como coautor 4 livros e 12 capítulos de livros.


Contato: salamuni@ufpr.br

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Fonte: Texto publicado na rede social do professor Salamuni.

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