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“A urgência da Ciência da Ciência”: coordenador da Pesquisa da Pesquisa publica artigo no Jornal da USP

Por Amâncio Jorge de Oliveira, professor do Instituto de Relações Internacionais da USP, Guilherme Ary Plonski, professor do Instituto de Estudos Avançados da USP, e Sérgio Salles-Filho, professor do Instituto de Geociências da Unicamp. Clique para ler o artigo na página do Jornal da USP.

O Brasil tem um ecossistema de ciência e inovação pujante e reconhecido internacionalmente. O País conta com a presença de fundações de apoio à pesquisa em todo o território nacional, um sistema nacional de pós-graduação responsável pela ampla maioria da produção científica nacional, universidades públicas (estaduais e federais) bem-posicionadas nos rankings internacionais, posição de destaque na produção de artigos científicos e cursos classificados entre os melhores do mundo.

Nada garante, contudo, que este sistema não possa sofrer reveses preocupantes. De tempos em tempos surgem sinais de risco. O mais iminente, e que vem mobilizando a comunidade científica do Estado de São Paulo e do País, diz respeito à possibilidade de corte orçamentário da Fapesp.

Figuram como riscos recorrentes a interrupção de programas críticos como o monitoramento de florestas, ações contra a autonomia das universidades públicas, fuga de pesquisadores para o exterior, depreciação da carreira de docentes e pesquisadores, campanha de descrença à ciência, dentre outros.

Não existe antídoto único capaz de neutralizar as diferentes frentes de ataques à ciência brasileira. É preciso atuar em todas essas frentes. Mas existe uma ação capaz de funcionar como elemento protetivo importante para a ciência e para o ecossistema nacional.

Trata-se da constituição de centros e programas de ciência da ciência, com presença e importância crescentes em diversos países. Research on Resarch Institute (UK), Institute of Science and Techonolgy Policy (George Washington University), Science of Science and Innovation Studies (Northwestern University) e o Centre for Science and Technology Studies (University of Leiden) são alguns exemplos. Outros estão surgindo na medida em que fica evidente que os estudos sobre o impacto da ciência nas sociedades precisam ser sistemáticos e não ocasionais.

Um centro de ciência da ciência usa métodos científicos para acompanhar a concepção, execução e impactos de programas e políticas científicas. Envida esforços para aprofundar conhecimentos sobre como funcionam os ecossistemas de pesquisa e, com base neste conhecimento, contribui para que ampliem a efetividade e os impactos positivos da pesquisa nos planos social, econômico, ambiental e intelectual. Trata-se, portanto, de criar evidências para demonstrar, comunicar e ampliar os impactos dos benefícios da ciência e da pesquisa para a sociedade.

É claro que as próprias instituições de fomento têm instrumentos de acompanhamento dos múltiplos impactos da ciência. Um bom exemplo foi o estudo produzido pela Fapesp responsável por mapear os impactos das pesquisas patrocinadas pelas instituições na produção de política públicas em outros países e em organismos internacionais. Outro bom exemplo é o acompanhamento do impacto dos investimentos em pesquisas na geração de novas empresas. São avaliações fundamentais e que devem seguir sendo implementadas. O maior desafio decorre do fato de que as iniciativas de ciência da ciência encontram-se disponíveis no Brasil, mas estão dispostas de forma fragmentada, sem a necessária escala e alcance.

A contribuição de centros de programas devotados à ciência da ciência seria a possibilidade de empreender estudos sobre a inter-relação entre as diversas instâncias de financiamento à pesquisa, assim como a comparação com práticas internacionais. Permite ainda avaliar a inter-relação entre diversas dimensões da prática científica, como financiamento, inclusão, práticas de avaliação, modelos de carreiras, desenhos institucionais de organizações científicas e assim por diante. Programas desta natureza são também conhecidos como “meta-pesquisa” ou “metaciência”.

A ciência da ciência traria, ainda, uma contribuição decisiva para a comunicação com a sociedade. A tradução para um amplo número de pessoas de como a ciência atua e de seus impactos e benefícios, em linguagem adequada, é parte inseparável dos centros dessa natureza.

A ciência precisa, urgentemente, apresentar-se à sociedade de outra maneira. Não basta dizer que é importante e quem a rejeita é negacionista, terraplanista e outros adjetivos que servem mais para distanciar que aproximar. Os argumentos favoráveis existem e são convincentes. Estão no encontro da ciência com a sociedade. É preciso estudá-los, descobri-los e comunicá-los adequada e sistematicamente.


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