Novo observatório para trazer o “solo das profundezas”

por: Francisco Ladeira.

Ecotron moverá núcleos de 3 metros de solo para o laboratório para experimentos de mudanças climáticas globais


No dia 12 de outubro, a revista Science publicou uma interessante reportagem sobre solos . Trata-se de um projeto em início de desenvolvimento na Universidade de Idaho, denominado Deep Soil Ecotron. A ideia central é trazer, para o laboratório, colunas completas de solo de até 3 metros e aí, sob condições controladas, acompanhar seu desenvolvimento, tanto em suas características bióticas quanto abióticas.

Um Ecotron é um tipo de experimento criado para estudar o impacto do clima nos ecossistemas e nos processos de biodiversidade. Geralmente é composto por várias unidades experimentais idênticas, que permitem a contenção do ecossistema, o controle das condições ambientais e a medição online dos processos ecofisiológicos.

Imagem: Laboratório com esferas ecossistêmicas para pesquisa climática no Parque Nacional Hoge Kempen. Reprodução Universidade de Hasselt

Ecotron CNRS

Os motivos para realizar este acompanhamento são diversos. Parcela significativa dos estudos sobre solos se concentra especialmente em seus primeiros 30 centímetros, pois aí está o principal nível com interesse para o desenvolvimento das diferentes atividades agrícolas. Abaixo disso, o solo é, comparativamente, muito menos conhecido.

O solo, além da sua porção superficial, é crítico para alterações climáticas, para a qualidade da água, manutenção dos ecossistemas e até para a produção mineral. Mas o perfil de solo, como um todo, é incrivelmente difícil de estudar. Escavar uma trincheira sem perturbar sua estrutura e habitantes é praticamente impossível. Quanto mais fundo se vai, mais difícil é. 

Para tentar solucionar estes problemas. A U.S. National Science Foundation irá financiar o Ecotron com um valor total de US$ 19 milhões. O novo laboratório permitirá aos pesquisadores manipular uma série de fatores em colunas hermeticamente fechadas e controladas, incluindo temperatura, umidade e concentrações de dióxido de carbono (que influenciam o desgaste das rochas e a formação do solo). Eles serão capazes de simular a ressurgência das águas subterrâneas e talvez até mesmo os ciclos de congelamento e descongelamento que podem acelerar o desenvolvimento do solo. Também poderão acompanhar os organismos vivos presentes na coluna.

Renderização artística da instalação de Deep Soil Ecotron financiada pela NSF. Até 24 ecounits serão alojados na Universidade de Idaho, equipados com analisadores de última geração para quantificar o fluxo de gases do efeito estufa, a química da água do solo, o crescimento das raízes e a micro e mesofauna do solo. Imagem: Reprodução deepsoilecotron.org

Para Emma Aronson da Universidade da Califórnia, Riverside, um dos pontos chaves é a possibilidade de estudar como o carbono no solo pode responder às mudanças climáticas futuras, simulando condições de mudança com um grau de controle que nunca visto antes. Os proponentes do projeto acreditam que os solos profundos aqueçam com o aquecimento da Terra, e experimentos de campo sugerem que isso pode fazer com que o solo libere carbono na atmosfera 30% a 50% mais rápido do que hoje, afetando diretamente o ciclo de carbono.

O laboratório estará pronto em 5 anos e terá capacidade para 24 colunas de solo, incluindo a vegetação de cobertura. Uma empresa já está testando alternativas para a coleta em campo das colunas de até 3 metros, desafio significativo pois esta terá que ser a menos perturbada possível. Mesmo assim haverá perturbações, pois, raízes serão cortadas e porções inferiores do solo serão expostas na superfície. E claro, uma coluna em um laboratório não “funcionará” exatamente como um solo posicionado na paisagem. De qualquer forma os avanços científicos para o conhecimento do funcionamento do solo serão significativos.


Sobre o autor

Francisco Sergio Bernardes Ladeira

Graduou-se bacharel em Geografia pela Universidade Estadual Paulista – Júlio de Mesquita Filho (1989), mestre em Geografia (Geografia Física) pela Universidade de São Paulo (1995) e doutor em Geografia (Geografia Física) pela Universidade de São Paulo (2001). Atualmente é MS-3.2 da Universidade Estadual de Campinas. Tem experiência na área de Geociências, com ênfase em Paleopedologia, Superfícies Geomorfológicas e Relação Solo-Relevo.


Texto: Francisco S. B. Ladeira

Edição: Diego F. T. Machado

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