Dia da conservação do Solo e da Água

por: Baldoino Neto –

Uma data para lembrar a necessidade de se proteger um dos nossos recursos naturais mais importantes.


Em 15 de abril é comemorado o Dia da Conservação do Solo. A data foi escolhida em homenagem ao nascimento de Hugh Hammond Bennett (15 de abril de 1881 – 7 de julho de 1960), considerado o pai da conservação dos solos nos Estados Unidos e o criador do Serviço de Conservação de Solos americano.

Hugh Hammond Bennett liderou o movimento de conservação do solo nos Estados Unidos nas décadas de 1920 e 1930, instigou a nação a enfrentar a “ameaça nacional” da erosão do solo e criou uma nova agência federal, atuando como seu primeiro chefe – o Serviço de Conservação do Solo, agora Departamento de Agricultura do Serviço de Conservação de Recursos Naturais dos EUA. Ele é considerado hoje o pai da conservação do solo. Durante sua experiência em campo, ao comparar áreas virgens e arborizadas com campos erodidos, ele se convenceu de que a erosão do solo era um problema, não apenas para o agricultor, mas também para as economias rurais. (NCRS – USDA: Hugh Hammond Bennett Biography)

A data é celebrada no Brasil, desde 1989, com o objetivo de fomentar e demonstrar a importância de termos diversos cuidados para mantermos saudável esse recurso natural que é de fundamental importância para a produção de alimentos, manutenção das florestas, conservação da água, entre tantas outras interações com o ecossistema.

As atividades humanas têm impactado crescentemente a conservação dos solos. Retirada de florestas e a utilização da terra para agricultura e pastagem são apenas algumas das ações que modificam a sua estrutura e todo o equilíbrio ambiental, e afetam não só animais e florestas como os próprios homens.

O exemplo mais visível disso ultimamente tem sido a questão urgente da água. A escassez do recurso, seja aqui no Brasil e ou em outras partes do mundo, invariavelmente tem uma coisa em comum: o mau uso do solo, provocando seu desgaste e erosão, retirando dele a capacidade de renovação.

Ao ficar exposto aos efeitos climáticos, sem cobertura vegetal e sem o manejo adequado, o solo não cumpre efetivamente com a sua função básica de “produzir” água: garantir a infiltração da água e recarregar o lençol freático, que alimenta as nascentes e os rios, que, por sua vez abastecem reservatórios.

Segundo relatório da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), cerca de 1/3 dos solos do mundo estão degradados por erosão, salinização, compactação, acidificação e contaminação, bem como por influência das mudanças climáticas.

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O solos estão sendo degradados em diversos locais no planeta. Atualmente, a Europa apresenta a maior proporção com relação aos demais continentes, isso por conta de sua longa história de uso intensivo dos solos pela agricultura. Todavia, a degradação está avançando rapidamente nos países em desenvolvimento na África e Ásia. Fontes: Dados do United Nations Environment Programme (UNEP), 2002. Global Environmental Outlook 3. London.

Entre as principais consequências, estão o agravamento das enchentes, a perda de fertilidade e, consequentemente, a redução na produtividade agrícola.

De acordo com a FAO – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura:

Cerca de 33% do solo mundial está degradado.

A degradação do solo afeta pelo menos 3,2 bilhões de pessoas, o que equivale a 40% da população mundial.

A cada 5 segundos, o mundo perde uma quantidade de solo equivalente a um campo de futebol.

A ONU alerta para a redução de até 8% ao ano no PIB de países em desenvolvimento quando ocorre o manejo inadequado do solo.

Cerca de 95% dos alimentos produzidos vêm da terra. A produção de alimentos terá de aumentar em aproximadamente 60% para alimentar a população mundial no ano de 2050, ou seja, aproximadamente 30% maior que a atual.

A Erosão dos solos é o principal tipo de degradação dos solos em escala mundial. – Voçoroca no município de São Roque de Minas – MG (Diego F.T. Machado, 2021)

Quando utilizados de forma sustentável, os solos podem desempenhar um papel importante na diminuição das alterações climáticas, por meio da captura de carbono e outros gases do efeito estufa.

A ONU alerta para a redução de até 8% ao ano no PIB de países em desenvolvimento quando ocorre o manejo inadequado do solo.

O planeta perde 24 bilhões de toneladas de solo fértil por ano, levando à desertificação de grandes áreas, desequilíbrio ambiental e ao prejuízo para a saúde humana.


Fontes:

https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/11582581/dia-nacional-da-conservacao-do-solo-sua-historia-e-um-alerta-da-fao

https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/11618575/no-dia-nacional-da-conservacao-do-solo-a-embrapa-confirma-compromisso-com-pesquisas-na-area

https://wedocs.unep.org/handle/20.500.11822/8609

https://www.nrcs.usda.gov/wps/portal/nrcs/detail/national/about/history/?cid=nrcs143_021410


Texto: Baldoino Neto

Edição: Diego F. T. Machado

Destaques do Dia Mundial dos Solos 2021

por: Diego F. T. Machado.

A FAO publicou recentemente o relatório da campanha de 2021 do Dia Mundial do Solos, e mais uma vez o Brasil se destacou no número de iniciativas.


No dia 05 de dezembro é comemorado o Dia Mundial do Solo, evidenciando a importância de solos saudáveis para uma vida saudável.

O tema proposto para 2021 foi “Halt Soil Salinization, boos soil productivity” (Impedir a salinização dos solos para aprimorar a produtividade).

A salinização reduz muito a produtividade do solo e a prestação de serviços ecossistêmicos. com estas desafios em mente, os participantes se reuniram para trocar seu conhecimento, experiência, interesse e compromisso com a proteção e gestão dos solos do nosso planeta para que sejam preservados para as gerações futuras.

Os eventos ao redor do mundo

Diversos foram as abordagens utilizadas para abordar a importância da preservação e conservação dos solos ao redor do globo.

A campanha alcançou milhões de pessoas na República Popular da China (126 eventos), Índia (67), Reino da Tailândia (62), Brasil (50), México (29), Espanha (27), Paquistão (19) bem como nos Estados Unidos da América e na Itália (13). Outros países com Argentina, Irã, Indonésia, Cuba, Turquia. Equador, Portugal, Peru, Egito, Ucrânia, Malásia, Polônia e Bolívia, também foram representados durante as celebrações.

Concurso de Livros Infantis

Foram 27 fantásticos livros recebidos de 14 países. Os livros estão disponíveis para download apenas na versão em língua inglesa no site da FAO (Acesse). Os três primeiros colocados foram:

O primeiro classificado foi “The Beetles: a Salty Soil Journey” de Teresa Porter, Franco López Campomane e Lewis Fausak da University of British Columbia, Canadá;

Em segundo lugar: “Solo Extraordinário da Terra para Todos os Organismos Vivos. Aprendendo, pensando e agindo!” por Marcela Bianchessi da Cunha Santino, Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Brasil;

O Terceiro classificado: “Por que não se pode plantar nos campos?” por Song Zikang, Universidade de Geociências da China, República Popular da China (RPC).

Brasil ganha destaque nas comemorações do WSD

Mais uma vez o Brasil fica entre os países com maior número de iniciativas voltadas as comemorações do Dia Mundial dos Solos (WSD). Foram 50 atividades registradas no site da F.A.O., além de cinco livros inscritos no concurso de Livro Infantis.

Solo Extraordinário da Terra para Todos os Organismos Vivos. Aprendendo, pensando e agindo! por Marcela Bianchessi da Cunha Santino, Universidade Federal de São Carlos (UFSCar); (baixe aqui).

Get out of here, salinity, leave mu soil alone, de Adriana de Fátima e Rivaldo Vital; (ENG – baixe aqui) (PT-BR – baixe aqui).

Solinho in the Caatinga. Halt soil salinization, Boost soil productivity, de Bruna Arruda, Marcia Vidal Candido Frozza, Nayana Alves Pereira, Clécia Cristina Barbosa Guimarães, Aldeir Ronaldo Silva, Antonio Carlos de Azevedo, Tiago Ramos de Azevedo, Josiane Millani Lopes Mazzetto, Wilfrand Freney Bejarano Herrera, Beatriz Rosa Chiodeli e Cyan Turner; (ENGbaixe aqui).

The History of Rocky, the Soil, DE Bruna Vicente; (ENG – baixe aqui).

The fun soil profiles in: How to reduce soil salinization to increase productivity, de Adriana Ribon; (ENG – baixe aqui).

Dentre os eventos, o LABPED organizou o III Seminário Solos, Ambiente e Sociedade. Foram realizados painéis debatendo a importância da educação e solos, a importância da divulgação científica e das políticas públicas voltadas a inventariação e planejamento para o uso do solo como recurso. Além disso, palestras abordando as propriedades e cuidados com solos salinos foram conduzidas por experientes profissionais e cientistas.

Todo material pode ser acessado no site ou no canal no YouTube.

Glinka World Soil Prize

O prêmio anual concedido desde 2016 a pesquisadores por suas contribuições diretas para a preservação do meio ambiente, segurança alimentar e redução da pobreza.

A Dra. Lydie-Stella Koutika foi a vencedora da edição de 2021. Ela é uma conhecida cientista do solo da República do Congo com mais de 30 anos de experiência em pesquisa aplicada em agroecossistemas.

Lydie-Stella Koutika Fonte: Reprodução FAO World Soil Day – 5 December 2021. Campaign Report

Sua pesquisa se concentra na saúde do solo e nos processos de degradação para combater a insegurança alimentar e promover a mitigação e adaptação às mudanças climáticas.

O prémio reconhece a sua contribuição para melhorar e expandir o conhecimento dos solos africanos e o impacto considerável que teve na comunidade científica e nos meios de subsistência dos agricultores.

Prêmio King Bhumibol

Lançado em 2018, o Prêmio do Dia Mundial do Solo King Bhumibol reconhece indivíduos ou instituições que aumentam a conscientização pública sobre os solos, organizando celebrações bem-sucedidas e influentes do Dia Mundial do Solo.

O Instituto de Ciência do Solo da Nigéria (NISS) ganhou a edição de 2021 por seu compromisso em aumentar a conscientização sobre a importância de solos saudáveis.

Nigeria Institute of Soil Science (NISS) Fonte: Reprodução FAO World Soil Day – 5 December 2021. Campaign Report

O NISS é a organização responsável pela coordenação, orientação e gestão daqueles que trabalham em ciência do solo, pesquisa e educação na Nigéria.

O NISS organizou uma série de eventos envolvendo diferentes atores em todos os setores; projetos educacionais em escolas primárias e secundárias, comícios, caminhadas, conferências de especialistas, simpósios, oficinas, apresentações artísticas, ensaios em fazendas e exibições.

As celebrações foram amplamente divulgadas online e foram divulgadas por seis jornais nacionais, atingindo cerca de meio milhão de pessoas na Nigéria.


Fonte: World Soil Day – 5 December 2021. Campaign Report


Descrição morfológica do solo – com Peter Schad

por: Diego F. T. Machado

É hora de afiar os sentidos e colocar as mãos na massa (ou no solo)


A descrição de solos é o primeiro passo para uma diversidade de estudos pedológicos. Compreender como se dá a organização de suas fases e suas expressões morfológicas é fundamental para sua classificação. Além disso, esse procedimento investigativo pode fornecer diversas informações sobre sua formação e seu comportamento em relação ao uso agrícola.

A caracterização dos solos em campo segue padrões já bem estabelecidos. No Brasil, tomamos como referência o Manual de Descrição e Coleta de Solo no Campo, o Manual Técnico de Pedologia (IBGE), além Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (SiBCS).

Tradicionalmente a descrição morfológica do solo é baseada naquelas propriedades detectadas pelos sentidos, sobretudo visão e tato, e em alguns casos, audição.

O professor Peter Schad, (Technische Universität München) presidente do grupo de trabalho IUSS WRB (Base de Referência Mundial para Recursos de Solos) produziu um vídeo didático demonstrando os procedimentos para a caracterização morfológica de solos.

Os vídeos podem ser assistidos no YouTube, nas versões em inglês e espanhol. Foram utilizadas as Diretrizes da FAO (2006) para descrição do solo e o WRB (2015) para classificação do solo.

Em sua apresentação, Peter Schad apresenta uma interessante abordagem para a classificação expedia da textura do solo. O fluxograma com as orientações está disponível nas versões em Inglês e Espanhol (Acesse).

The Ultimate Soil Texture Flow Chart (USTF)© Vincent Buness, Peter Schad, Margaretha Rau; Technical University of Munich 11 January 2022
TUM Edafología: Descripción de suelos (Guía FAO 2006) y clasificación de suelos (WRB 2015) – Lehrstuhl für Bodenkunde, TU München

Novo observatório para trazer o “solo das profundezas”

por: Francisco Ladeira.

Ecotron moverá núcleos de 3 metros de solo para o laboratório para experimentos de mudanças climáticas globais


No dia 12 de outubro, a revista Science publicou uma interessante reportagem sobre solos . Trata-se de um projeto em início de desenvolvimento na Universidade de Idaho, denominado Deep Soil Ecotron. A ideia central é trazer, para o laboratório, colunas completas de solo de até 3 metros e aí, sob condições controladas, acompanhar seu desenvolvimento, tanto em suas características bióticas quanto abióticas.

Um Ecotron é um tipo de experimento criado para estudar o impacto do clima nos ecossistemas e nos processos de biodiversidade. Geralmente é composto por várias unidades experimentais idênticas, que permitem a contenção do ecossistema, o controle das condições ambientais e a medição online dos processos ecofisiológicos.

Imagem: Laboratório com esferas ecossistêmicas para pesquisa climática no Parque Nacional Hoge Kempen. Reprodução Universidade de Hasselt

Ecotron CNRS

Os motivos para realizar este acompanhamento são diversos. Parcela significativa dos estudos sobre solos se concentra especialmente em seus primeiros 30 centímetros, pois aí está o principal nível com interesse para o desenvolvimento das diferentes atividades agrícolas. Abaixo disso, o solo é, comparativamente, muito menos conhecido.

O solo, além da sua porção superficial, é crítico para alterações climáticas, para a qualidade da água, manutenção dos ecossistemas e até para a produção mineral. Mas o perfil de solo, como um todo, é incrivelmente difícil de estudar. Escavar uma trincheira sem perturbar sua estrutura e habitantes é praticamente impossível. Quanto mais fundo se vai, mais difícil é. 

Para tentar solucionar estes problemas. A U.S. National Science Foundation irá financiar o Ecotron com um valor total de US$ 19 milhões. O novo laboratório permitirá aos pesquisadores manipular uma série de fatores em colunas hermeticamente fechadas e controladas, incluindo temperatura, umidade e concentrações de dióxido de carbono (que influenciam o desgaste das rochas e a formação do solo). Eles serão capazes de simular a ressurgência das águas subterrâneas e talvez até mesmo os ciclos de congelamento e descongelamento que podem acelerar o desenvolvimento do solo. Também poderão acompanhar os organismos vivos presentes na coluna.

Renderização artística da instalação de Deep Soil Ecotron financiada pela NSF. Até 24 ecounits serão alojados na Universidade de Idaho, equipados com analisadores de última geração para quantificar o fluxo de gases do efeito estufa, a química da água do solo, o crescimento das raízes e a micro e mesofauna do solo. Imagem: Reprodução deepsoilecotron.org

Para Emma Aronson da Universidade da Califórnia, Riverside, um dos pontos chaves é a possibilidade de estudar como o carbono no solo pode responder às mudanças climáticas futuras, simulando condições de mudança com um grau de controle que nunca visto antes. Os proponentes do projeto acreditam que os solos profundos aqueçam com o aquecimento da Terra, e experimentos de campo sugerem que isso pode fazer com que o solo libere carbono na atmosfera 30% a 50% mais rápido do que hoje, afetando diretamente o ciclo de carbono.

O laboratório estará pronto em 5 anos e terá capacidade para 24 colunas de solo, incluindo a vegetação de cobertura. Uma empresa já está testando alternativas para a coleta em campo das colunas de até 3 metros, desafio significativo pois esta terá que ser a menos perturbada possível. Mesmo assim haverá perturbações, pois, raízes serão cortadas e porções inferiores do solo serão expostas na superfície. E claro, uma coluna em um laboratório não “funcionará” exatamente como um solo posicionado na paisagem. De qualquer forma os avanços científicos para o conhecimento do funcionamento do solo serão significativos.


Sobre o autor

Francisco Sergio Bernardes Ladeira

Graduou-se bacharel em Geografia pela Universidade Estadual Paulista – Júlio de Mesquita Filho (1989), mestre em Geografia (Geografia Física) pela Universidade de São Paulo (1995) e doutor em Geografia (Geografia Física) pela Universidade de São Paulo (2001). Atualmente é MS-3.2 da Universidade Estadual de Campinas. Tem experiência na área de Geociências, com ênfase em Paleopedologia, Superfícies Geomorfológicas e Relação Solo-Relevo.


Texto: Francisco S. B. Ladeira

Edição: Diego F. T. Machado

Lateritas – múltiplas definições, múltiplos usos

por: Francisco Ladeira

Resultado da ação intensa do intemperismo, as lateritas são importantes indicadores de condições ambientais, com valor cultural agregado e um conceito mutante ao longo da história.


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O termo laterita foi proposto por Buchanan em 1807, para identificar materiais, que na Índia, eram extraídos dos finais de vertentes, da parte inferior dos perfis de solos, que quando expostos ao sol tornavam-se extremamente duros e eram utilizados como material de construção (tijolos, vigas estruturais, base de rodovias e de estradas de ferro).

O uso do termo laterita foi se alterando ao longo do tempo, e chega mesmo a ser indicado que não seja usado, dado a diversidade de possibilidades de interpretações. Não é nosso objetivo aqui discutir esse e outros termos que surgiram ao longo do tempo, apesar de indicarmos abaixo diversos artigos que tiveram esse objetivo.

Usamos aqui também o termo ferricrete, em sua definição inicial, ou seja, qualquer material enriquecido em ferro em relação ao seu material de origem. Esse termo também já teve nova definição, para indicar concentrações ferruginosas decorrentes de acumulações absolutas de ferro. Isso exemplifica a complexidade do uso dos termos associados a estes materiais.

Francis Buchanan-Hamilton #
Possível aparência do Dr. Francis Buchanan, mais tarde Hamilton ou Hamilton-Buchanan. Cirurgião, agrimensor e botânico da Companhia das índias, publicou trabalhos sobre a geografia, a flora e a fauna da Índia, onde viveu e explorou desde o final do século 18 até 1815. Saiba mais! Foto: Reprodução Memim Encyclopedi

Resultado da ação intensa do intemperísmo!

De maneira geral Schellmann (1981) indica que estes materiais correspondem a “produtos de intensa alteração subaérea da rocha, cujo teor de ferro e/ou alumínio é maior e o de sílica é menor que a rocha parental. Estes consistem predominantemente de assembleias minerais de goethita, hematita, hidróxidos de alumínio, caulinita e quartzo”.

Estas características, apontadas por Schellmann, indicam que a ocorrência de lateritas estão associadas a climas quentes e úmidos, que ocorrem nas zonas intertropicais da Terra.

A zona de rubefação coincide com a área intertropical de formação de laterita (Tardy, 1993).

A intensidade dos processos de intemperismo químico nas zonas intertropicais é indicado por Stallard e Edmond (1983), Meybeck (1987) e Buss et al. (2017) que destacam que os trópicos recobrem cerca de 25% das terras emersas do planeta, entretanto, são responsáveis por cerca de 65% do fluxo de sílica dissolvida para os oceanos via processos de intemperismo químico.

Importantes indicadores da evolução da paisagem

Estes materiais só evoluem nestas condições, entretanto, atualmente ocorrem em diferentes regiões da Terra, como deserto do Saara ou porções da Sibéria. Desta forma, as lateritas são ótimos indicadores da deriva das placas tectônicas, pois estas lateritas se formaram em áreas tropicais e posteriormente a deriva das placas tectônicas teria posicionado estes materiais nestas regiões.

Essa possibilidade decorre do fato das lateritas serem, quando desidratadas, extremamente resistentes aos processos erosivos. Nas áreas tropicais, como no Brasil, vastas regiões possuem, nas áreas mais elevadas, espessos perfis de alteração com lateritas em seu topo.

No Brasil, diversas áreas elevadas topograficamente e com relevo plano a suave ondulado, apresentam como característica a ocorrência de lateritas nas bordas destas chapadas, que as ‘protegem’ dos processos erosivos, como no caso do Chapadão do Zagaia (MG). Foto: Acervo próprio

Apesar de serem encontradas nos topos de vertentes e escarpas, a laterita se forma nas áreas onde o lençol freático oscila durante muito tempo, ou seja, normalmente nas posições mais baixas do relevo.

As características de formação permitem utilizar as lateritas como importante indicador de condições paleotopográficas, paleoclimáticas, paleogeográficas e mais detalhadamente condições pedogenéticas.

A importância do fator tempo!

Quando as condições de formação se desenvolvem por longos períodos, em áreas tropicais úmidas, os perfis de alteração que recobrem as rochas frescas podem ser extremamente espessos, por vezes ultrapassando centenas de metros (Tricart, 1972; Scott e Pain, 2009) e são denominados de Perfis de Alteração Lateríticos ou apenas Perfis Lateríticos (BUT et al. 2009). Estes perfis de alteração normalmente estão associados a paleo-superfícies (BATTIAU- QUENEY, 1994).

Representação esquemática de um perfil laterítico coberto por um ferricrete (adaptado de Tardy, 1993)
Em cima – base do perfil laterítico afetando os depósitos da
Formação Marília; Em baixo – nível de mosqueamento posicionado acima dos sedimentos da Formação Marília. Fotos: Acervo próprio.

LATERITAS: Múltiplos usos…

As lateritas e perfis lateríticos e ferricretes foram utilizados como marcadores para correlações estratigráficas, para interpretações ambientais e paleoambientais, para análise da evolução geomorfológica, datações relativas de superfícies, indicadores de deriva continental, como marco para análises tectônicas, na produção de ouro, de ferro, de terras raras, do caulim, do níquel e como material de construção.

Pedreira de tijolos de Karaba (2009) - Autor: David Pace

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Esta é a pedreira de Karaba (Burkina Faso), onde os homens esculpem tijolos usando apenas picaretas de ferro de cabo curto. No quente sol equatorial, eles escavam o material que se tornará os blocos básicos de construção das casas e das paredes que estruturam as comunidades vizinhas.

LATERITAS: Múltiplas definições…

Diante do exposto, a laterita possui interesse para diferentes áreas de pesquisa de também econômicas, implicando que profissionais de diferentes áreas trabalharam com estes materiais. O resultado disso é que há uma grande diversidade de termos para nomear esta laterita, inclusive alguns termos possuem definições distintas em diferentes áreas do conhecimento e o mesmo termo foi alterando seu significado ao longo do tempo.

A título de exemplo há diversos trabalhos que discutem a questão relativa às diferenças terminológicas (THORP e BALDWIN, 1940; PENDLETON, 1941; PRESCOTT, 1954; SIVARAJASINGHAM et al., 1962; GERASIMOV e GLAZOVSKAYA, 1965; HAMMING, 1970; STEPHENS, 1971; PATON e WILLIAMS, 1972; HELGREN e BUTZER, 1977; SCHELLMANN, 1981, 1983; ALEVA, 1982, 1994; MILNES et al., 1985; OLLIER, 1988; TARDY E ROQUIN, 1992; TARDY, 1993; BOURMAN, 1993a, b; FIRMAN, 1994; YALLON, 1996; BOURMAN e OLLIER, 2002; AUGUSTIN, 2013; GHOSH e GUCHHAIT, 2020).

Na figura abaixo, é possível observar algumas das diferentes terminologias utilizadas. Assim a laterita de Buchanan passa a ter diferentes denominações, como ferricretes, duricrusts, couraças, cangas, entre outros. Por vezes estes termos aparecem na literatura como sinônimos, outras não, gerando grande confusão.

Comparação entre terminologias de um perfil laterítico com ferricrete Modificada de Anand & Paine (2002).

Ressalta-se que os pesquisadores que trabalham especificamente com pedologia também abordam esta temática, sendo que os solos desenvolvidos, associados aos materiais lateríticos, possuem importância agrícola, como no Brasil e, em solos quaternários, que podem também possuir um significado relevante na dinâmica geomorfológica mais recente. Em pedologia os termos plintita, petroplintita e a existência de um Horizonte F são aplicados no Sistema Brasileiro de Classificação de Solos.

Classificação dos ferricretes

No que se refere a classificação destes materiais, Bourman et al. (1987), Milnes et al. (1987) e Bourman (1993) propõem três tipos básicos de ferricrete (posteriormente o termo ferricrete foi definido com uma conotação genética, mas esta não existia para estes autores) com algumas subdivisões:

Rocha ferruginizada: rochas que apresentam impregnações ferruginosas, mas mantém suas estruturas perfeitamente identificáveis em campo. A forma mais comum é constituídas de mosqueados ferruginosos.

Sedimentos ferruginosos: ferricretes caracterizados por ampla variação de tipos de fábrica, que refletem a natureza do sedimento original. Por exemplo, no caso de sedimentos clásticos, o ferricrete apresenta abundantes grãos de areia ou clastos de quartzo e fragmentos de rocha. Quando cimentam clastos têm-se o ferricrete conglomerático. Se não existir qualquer estrutura interna será um ferricrete maciço.

Ferricretes complexos: possuem ampla diversidade de fábricas, identificando-se os seguintes tipos:


a) pisolítica: possuem grande quantidade de glébulas ferruginosas, dispersos no interior de uma matriz rica em óxidos de ferro;

b) “slaby” (laminar): formados dominantemente por placas ou lentes horizontais separadas por zonas ricas em argila;


c) vermiformes: formados por uma distribuição irregular de canais enriquecidos em ferro.


Coleção: Tipos de Ferricretes


O que influência na formação dos ferricretes?

No caso especifico dos ferricretes associados a perfis lateríticos, Thomas (1994) propõe oito fatores de formação determinantes.

1) fatores geológicos: qualquer tipo litológico pode originar os perfis lateríticos ferricretes. A composição mineralógica das rochas parentais pode influenciar fortemente na composição e nas características do perfil laterítico e ferricrete, mas os processos de intemperismo podem modificar significativamente estas características mineralógicas.

Alguns autores como Tardy et al. (1988) eTardy (1993) indicam uma influência gradativamente menor das características da rocha conforme maior o grau de evolução do perfil laterítico. Tardy et al. (1988) indicam uma tendência à homogeneização do perfil, em termos químicos e mineralógicos, independente do material de origem. A velocidade de formação dos perfis lateríticos pode variar conforme o tipo de rocha parental. Para o referido autor, as alterações sobre rochas máficas e ultramáficas podem chegar a uma velocidade três vezes maior do que sobre as de tipo félsicas.

2) fatores climáticos: fundamental para controlar a formação destes perfis. Tardy (1993) indica as seguintes características climáticas para sua formação: uma pluviosidade média anual de 1.450 mm; temperatura média anual de 28 oC; umidade relativa do ar média de 70% e uma estação seca com duração de 6 meses.

O tipo climático ideal de formação do ferricrete é aquele que corresponde às regiões de savana. Em direção à climas mais secos, ela não se forma com a disponibilidade de sílica no sistema, predominando solos com montmorillonita (LEPRUN, 1979) e também em climas muito úmidos sem estação seca, onde predominam a goethita e gibsita (BEAUVAIS e TARDY, 1993), entretanto, nestas condições ambientais mais úmidas é possível a destruição do ferricrete em certos pontos da paisagem e formação simultânea em outros.

3) Fatores bióticos: a ação da vegetação dependerá essencialmente do tipo de cobertura vegetal localizada sobre o ferricrete, através de sua ação na formação de ácidos e a ação mecânica de suas raízes. Esta ação pode definir morfologias de ferricretes. Segundo Tardy (1993), as termitas também podem possuir papel fundamental no processo de alteração do perfil laterítico e do ferricrete.

4) Fatores hidrológicos: os fatores hidrológicos são determinados pelo regime climático e pela interação com a litologia e o relevo. Esta combinação cria uma diversidade de ambientes locais com condições contrastantes para a mobilização ou precipitação do ferro e, especialmente, é fundamental a oscilação do lençol freático ao longo do ano.

5) Condições de Eh (potencial redox) e pH (potencial hidrogeniônico): o Eh torna o ferro mais móvel conforme seus valores aumentam e o pH diminui. Costa (1984) acrescenta que o pH nestes ambientes depende da atividade biológica superficial, das alterações mineralógicas desencadeadas e, como consequência, da composição química das águas percolantes.

Pequenas variações de pH e Eh na paisagem são responsáveis pela mobilidade ou precipitação do ferro, sendo essenciais para explicar, mesmo à curta distância, áreas com elevadas perdas e outras com elevadas concentrações de ferro. A figura abaixo apresenta as condições de Eh e pH para a formação das concentrações ferruginosas.

Limites dos domínios de Fe2+, Fe3+, Mn2+ e Mn4+. Fonte: Campy e Macaire (1989).

6) História geomorfológica e tectônica: a formação, evolução e destruição de ferricretes estão intimamente associadas à história da paisagem geomorfológica. As superfícies de aplainamento produziram ambientes extremamente favoráveis para seu desenvolvimento.

Deve-se destacar também que na literatura torna-se cada vez mais comum a associação da evolução de paisagens lateríticas com os processos de etchplanação (ZEESE, 1996). Também é comum indicar o ferricrete como responsável pela inversão do relevo, resultado de sua resistência aos processos intempéricos, conforme na figura ao lado.

7) fator tempo: o tempo necessário para o desenvolvimento de um espesso perfil de alteração passa, necessariamente dos 100.000 anos de duração (TARGULIAN E BRONNIKOVA, 2019). Nahon e Lappartient (1977) calcularam que um ferricrete de 0,5 a 1,0 metro de espessura requer 0,3 a 0,75 Ma. para sua individualização.

Sequência evolutiva apresentando inversão topográfica associada com a formação de duricrosta. Fonte: Summerfield (1991) e Pain et al. (2007)

Estes autores indicam que para a evolução de um perfil laterítico, sobre rochas vulcânicas, com a evolução de um manto de alteração caulinítico, individualização de um horizonte de acumulação de ferro e a evolução fisico-química da crosta ferruginosa, são necessários 6 Ma.

Na Amazônia brasileira, Oliveira e Schwab (1980) estimam um tempo mínimo de 2,8 Ma. para evolução de um perfil laterítico bem estruturado. Na literatura é possível fazer uma distinção entre os ferricretes associados a perfis lateríticos e outros que não apresentam a organização clássica nos diferentes níveis.

Figueiredo Filho et al. (2019) identificam, na região do Quadrilátero Ferrífero, espessos ferricretes associados a terraços fluviais de idade compreendida entre 140 e 83 ka. Destaca-se que nesta área há uma grande disponibilidade de ferro no sistema, por conta da presença comum de itabiritos. Desta forma, o ferricrete, per si, não é indicativo de uma evolução extremamente longa, mas ele associado a um espesso perfil laterítico sim.

8) Mudanças paleoambientais: ferricretes e perfis lateríticos ocorrem em diferentes latitudes e por conta disso podem ser utilizados como indicadores de paleolatitudes e de paleoambientes (ANNOVI et al. 1980; BARDOSSY, 1981; TARDY e ROQUIN, 1998; SCHMIDT et al., 1983; ZEESE, 1996; KUMAR, 1986; TARDY, 1993).

A literatura não apresenta uma origem única para o ferro que irá formar o ferricrete. Nitidamente, há um grupo de autores que indica um intemperismo essencialmente vertical e outro que indica a importância dos aportes laterais. Thomas (1994), após ampla revisão de literatura, identifica três possibilidades:

1) translocação vertical, através da qual o Fe2+ movimenta-se por algumas dezenas de metros, no sentido descendente, por movimento gravitacional da água subterrânea, ou ascendente por difusão iônica;

2) por transferência lateral de Fe2+ através da convergência de fluxo de água subterrânea para sítios de recepção, como vales e depressões;

3) retenção e acumulação nos horizontes superficiais (em forma de pisólitos ou nódulos) quando o perfil é rebaixado por intemperismo.

Beaudet e Coque (1994) indicam que na mesma paisagem pode-se observar diferentes gêneses de ferricrete, como a formação associada a formas residuais, também em glacis, onde há aporte lateral de ferro em solução, e eventualmente de forma mecânica na forma de clastos (figura abaixo).

É possível que um ferricrete esteja sendo alterado no topo e haja precipitação de ferro em sua base, conforme não só já observaram Tardy (1993), Moreau (1993) e Espíndola e Daniel (2008), mas também observaram os novos estudos de cronologia, que indicam a grande mobilidade de ferro no interior do ferricrete, observando-se várias gerações de solubilização e precipitação (SPIER et al., 2006).

Socle cristallin: embasamento cristalino; Altérite argileuse: alterita argilosa; Sable Limon
Argile
: Areia, silte, argila; (B): Ferricrete; (Gl): glacis de erosão com ferricrete (PI): plano silto-argiloso

Referências

David Pace Photography

Tenho fotografado no pequeno Burkina Faso, país da África Ocidental desde 2007. Nas minhas viagens anuais, moro na aldeia de Bereba, onde tenho documentado muitos aspectos da vida diária, incluindo a dança semanal (sexta à noite), o deslocamento noturno ( Sur La Route), moda local (Market Day), arquitetura tradicional (L’Ancien Village) e ocupações comuns (At Work). Outros projetos incluem a exploração da fabricação de tijolos (Karaba Brick Quarry), a mineração artesanal de ouro (Les Sites d’Or) e os quiosques de Ouagadougou, capital do Burkina Faso (Quiosques).


Sobre o autor

Francisco Sergio Bernardes Ladeira

Graduou-se bacharel em Geografia pela Universidade Estadual Paulista – Júlio de Mesquita Filho (1989), mestre em Geografia (Geografia Física) pela Universidade de São Paulo (1995) e doutor em Geografia (Geografia Física) pela Universidade de São Paulo (2001). Atualmente é MS-3.2 da Universidade Estadual de Campinas. Tem experiência na área de Geociências, com ênfase em Paleopedologia, Superfícies Geomorfológicas e Relação Solo-Relevo.


Texto: Francisco S. B. Ladeira

Edição: Diego F. T. Machado


Publicações Acadêmicas do LABPED

Cartas de Susceptibilidade a Movimentos Gravitacionais de Massa e Inundações.

por: Douglas Cabral –

As cartas são fundamentais para o planejamento adequado de uso e ocupação das terras, afim de reduzir perdas materiais e de vidas humanas.


As Cartas de Suscetibilidade a Movimentos Gravitacionais de Massa e Inundações são documentos cartográficos que representam a possibilidade de ocorrência de movimentos gravitacionais de massa (deslizamentos e corridas de detritos) e processos hidrológicos (inundações e enxurradas).

O levantamento consiste numa modelagem matemática feita em escritório, a qual posteriormente é validada em trabalho de campo por uma equipe de pesquisadores do Serviço Geológico do Brasil-CPRM, que percorre toda a extensão do município.

A elaboração das Cartas de Suscetibilidade a Movimentos Gravitacionais de Massa e Inundações está prevista no Plano Nacional de Gestão de Riscos e Resposta a Desastres Naturais. Com início em agosto de 2012, os municípios do território brasileiro iniciaram a cartografia dos temas-fim do projeto.

As áreas são classificadas em alta, média e baixa suscetibilidade a movimentos de massa e inundações.

Adicionalmente, são apresentadas as feições geológicas (cicatrizes de deslizamentos, feições erosivas, paredões rochosos e blocos de rocha), além de mapas de padrões de relevo, também desenvolvidos pela equipe envolvida e mapas de solo e geológico-estrutural, na maior escala disponível.

A CPRM disponibiliza através de duas Notas Técnicas – informações sobre os procedimentos adotados para a elaboração de modelagens de inundação, e das cartas de suscetibilidade a movimentos gravitacionais de massa com o objetivo de orientar quanto aos procedimentos adotados na confecção das cartas.

Fluxograma das quatro etapas de execução da análise, classificação e zoneamento da suscetibilidade a inundações – Fonte: CPRM – Nota Técnica para elaboração de modelagens de inundação

Os dados referentes as cartas estão disponíveis para downlad no site do Serviço Geológico do Brasil

Municípios Mapeados: 526
Pessoas Contempladas pelo Projeto: 88.878.387
Cartas Publicadas em 2021: 18
Atualizado em: 25/05/2021

SAIBA MAIS

TV CPRM – Vídeo Institucional – Cartas de Suscetibilidade

Autoria: Douglas Cabral

Edição: Diego F. T. Machado

Foto da capa: Douglas Cabral – Santana/AP (inferior) e São Domingos do Norte/ES (superior)

A ação do clima na erosão dos solos no litoral brasileiro

por: Pedro M. Cheliz –

A ação das tempestades marinhas esta ligada com a erosão de solos no litoral, e existem possibilidades do problema se agravar com o tempo


A ação do clima pode trazer impactos para a erosão dos solos presentes no litoral. Tais mudanças não estão necessariamente associadas apenas a uma possível elevação do nível dos mar ao longo das próximas décadas, mas incluem também a incidência de eventos climáticos dos dias atuais.

Um exemplo é o possível aumento ao longo do tempo da quantidade e da intensidade das tempestades que atingem as áreas costeiras. Essas tempestades, muitas delas ligadas as frentes frias que se formam decorrentes da passagens de ciclones pelo Oceano Atlântico, contribuem para deixar as águas do mar mais agitadas, e a fazer com que elas atinjam as terras emersas com mais energia. Com isso, as águas removem parte dos solos sobre os quais as vegetações do litoral se instalam.

O aumento da força destas tempestades pode levar, assim, a uma maior ameaça para a conservação de solos e de alguns dos ecossistemas costeiros, como, por exemplo, as restingas.

A restinga é uma planície arenosa costeira, de origem marinha, incluindo a praia, cordões arenosos, depressões entre-cordões, dunas e margem de lagunas, com vegetação adaptada às condições ambientais” – Foto: Diego F.T. Machado

De fato, em muitas áreas do litoral brasileiro vem se registrando tais problemas de perda de solos e vegetação devido a erosão costeira. Uma deles é a Ilha do Cardoso, no litoral sul de São Paulo, no município de Cananéia. Tais processos locais vem sido acompanhado ao longo do tempo por pesquisadores de diversas instituições – tais como IPEC, Instituto Geológico, UFPR, UNICAMP e USP.

Restos de solos e restos de raízes alterados pelo contato com água do mar em outra área que teve seus solos erodidos pelo mar. Fonte: Cheliz (2015)
Árvore com raiz exposta e restos de raízes em área da Ilha que teve seus solos erodidos. Fonte: Cheliz (2015)

A influência das tempestades na ação das águas sobre a terra emersa nos últimos anos contribuiu para que uma parte dos solos e das matas de restingas locais fossem destruídas pela ação do mar. As imagens acima destacam áreas afetadas pela erosão (outrora vegetadas) que foram convertidas em faixas de areia.

Em alguns trechos do norte da Ilha, a linha de costa chegou a apresentar um recuo horizontal maior do que 200 metros em menos de 5 anos, como documentado em recentes estudos de pesquisadores da UNICAMP. (consulte na seção saiba mais)

A ação das águas do mar sobre as terras emersas ao longo do tempo chegaram mesmo a romper a Ilha do Cardoso em duas ilhas menores em 2018, por ocasião de uma forte tempestade marinha ligada a passagem de uma frente fria. Desde então, pesquisadores registraram como centenas de metros quadrados de solos recobertos por diferentes vegetação foram destruídos pela ação das águas do mar.

Imagem de drone obtida logo após o rompimento da continuidade da Ilha do Cardoso pela erosão costeira, e traçados ilustrando as transformações de sua linha de costa desde então, se aproximando de comunidades de pescadores que ali vivem. Fonte: Cheliz et al. (2018). Imagem de drones obtida por Edison Nascimento

Alguns estudos defendem que as tempestades no litoral brasileiro nos próximos anos podem se tornar mais fortes e frequentes, com a ação das chuvas e dos ventos se tornando mais intensas. Uma parte destas mudanças teria influência do impacto da ação humana no ambiente. Desta maneira, é importante que se busque monitorar continuamente a erosão dos solos no litoral, buscando levantar conhecimentos que ajudem a compreender os processos que a controlam para tentar diminuir seus impactos e danos.

Criado em 2021 pelo Instituto de Pesquisas de Cananéia (IPEC). Texto: Pedro Michelutti Cheliz e Shany Nagaoka. Edição e narração: Carime Carrera Pinhatti e Marina Kneipp Ramos. As informações utilizadas no vídeo foram compiladas por Pedro Michelutti e retiradas dos estudos dos seguintes pesquisadores: Carolina Barnez Gramcianinov (USP), Celia Regina Gouveia de Sousa (Instituto Geológico) e Pedro Michelutti Cheliz (UNICAMP). Imagens usadas no vídeo foram compiladas por Pedro Michelutti e Shany Nagaoka, a partir de fotografias e gravações feitas por: Carolina Barnez Gramcianinov, Celia Regina Gouveia de Souza, Edison Nascimento, João Zicuti, Henelice Trudes, Mario Nunes, Noeli Neves, Pedro Michelutti Cheliz, Portal Tempo.com, Rafael Poccia Costa e Shany Nagaoka

Para saber mais

Angulo R.J., Souza M.C., Müller M.E. Previsão e consequências da abertura de uma nova barra no Mar do Ararapira, Paraná-São Paulo, Brasil. Quaternary and Environmental Geosciences, 1(2): 2009, p 67-75.

Müller M.E.J. 2010. Estabilidade morfo-sedimentar do Mar do Ararapira e consequências da abertura de uma nova barra. Pós-Graduação em Geologia, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, Dissertação de Mestrado, 2010, 75p.

Cheliz, P.M. Ilha do Cardoso – contribuições para a compartimentação do relevo. Dissertação de mestrado. 2015.

Souza, C.R; Nunes, M. 2015. Monitoramento de Processos Sedimentares na Enseada da Baleia (Ilha do Cardoso, Cananéia/SP) entre 2007-2015. Anais do XV Congresso da Associação Brasileira de Estudos do Quaternário. São Paulo, 2015.

Gramcianinov, C. Mudanças nos Ciclones do Atlântico Sul devido às Mudanças Climáticas. Tese de doutorado. USP. 2018.

Cheliz, P.M.; Sousa, C.R.G; Nascimento, E; Nunes, M; Oliveira, R.C. Apontamentos sobre oscilações geomorfológicas e impactos ambientais na ruptura da Ilha do Cardoso, e formação de nova barra do Canal de Ararapira (Cananéia-SP). In: Geografia Física e Mudanças Globais. 2019.

Souza, C.R.G; Cheliz, P.M; Nascimento, E; Pisciota, K; Nunes, M; Pocca, R. O PROCESSO EROSIVO NA ENSEADA DA BALEIA, PARQUE ESTADUAL DA ILHA DO CARDOSO (CANANÉIA/SP): EXEMPLO DE ADAPTAÇÃO A RISCOS COSTEIROS. In: Planejando o Futuro Hoje: ODS 13, Adaptação e Mudanças Climáticas em São Paulo. IEE-USP. 2019.


Texto: Pedro Michelutti Cheliz

Edição: Diego F. T. Machado

Foto da capa: Edison Nascimento/Fundação Florestal – Em 2018, após forte ressaca, a Ilha do Cardoso foi dividida em duas, ligadas apenas por uma estreita faixa de areia.

As “Pedras Equilibristas”

por: César H. B. de Farias –

Impossível se manter indiferente a estes monumentos naturais, as Pedras Equilibristas se destacam na paisagem e no imaginário popular.


As “Pedras Equilibristas” também conhecidas como “Balanced Rocks” ou “Precariously Balancing Rocks” (PBRs) em inglês ou “Piedras Equilibristas” em espanhol são feições naturais resultado da ação de processos de origem geológica e/ou geomorfológica compostas por grandes blocos rochosos que se mantém em um delicado equilíbrio sobre um ou mais pontos de apoio.

Seu equilíbrio é tamanho que muitas destas feições aparentam estar prestes a tombar/desmoronar, no entanto, nenhum ser humano foi capaz de movê-las (ainda). Tais feições apresentam milhares (ou alguns milhões) de anos de idade e podem ser encontradas em todo o mundo sob os mais diferentes tipos de rochas (granitos, basaltos,  arenitos, quartzitos) e regimes climáticos (tropical, temperado e árido), sobretudo naquelas áreas cratônicas e/ou de cinturões orogênicos antigos.

Origem e Significado das Pedras Equilibristas

A origem destas feições é amplamente discutida no meio científico e está comumente associada à evolução de espessos mantos de intemperismo, típicos de margens passivas1 sujeitas a climas tropicais úmidos e posterior exposição em função da denudação fluvial ou pluvial.

1Borda ou margem de um continente sem tectonismo pronunciado como, por exemplo, as margens continentais junto à costa brasileira, e que não coincidem com borda de placa tectônica. Glossário Geológico – CPRM

Alguns autores indicam a possibilidade de blocos transportados por geleiras, mas estes exemplos são mais raros e restritos a regiões que foram atingidas pelo último máximo glacial. Para diversos autores a origem, o desenvolvimento e sobretudo a preservação dos blocos na paisagem pode ser tradicionalmente explicada pelo seguinte modelo:

Modelo de desenvolvimento proposto para as “Pedras Equilibristas” encontradas em áreas graníticas. Estágio I) Inicialmente ocorre o intemperismo químico subsuperficial ao longo das superfícies das juntas e o desenvolvimento de material transportável mecanicamente; Estágio II) Exumação dos núcleos esferoidais assim como sua colocação em posições precárias/pouco usuais. Fonte: Twidale, 1982.

Rabassa et al. (2021) afirmam que as pedras equilibristas encontradas na América do Sul estariam diretamente relacionadas às áreas de ocorrência da antiga Paleo-superfície Gondwana, sendo um forte indicativo da presença de climas tropicais úmidos no passado do nosso continente.

Além disso, é comum na literatura trabalhos associando tais feições com a estabilidade tectônica local. A simples presença de tais estruturas pode ser interpretada como um importante indicativo para a paleosismologia, uma vez que seu delicado equilíbrio poderia ser facilmente rompido, mesmo por abalos sísmicos de baixa intensidade.

De forma geral ainda se sabe muito pouco sobre o real significado geológico/geomorfológico e até mesmo histórico/arqueológico destas feições, uma vez que várias pedras se encontram associadas a sítios arqueológicos e a pinturas rupestres.

Potencialidades e Exemplos Brasileiros

Uma das principais potencialidades das “Pedras Equilibristas” reside na sua capacidade de atrair turistas, indicando um elevado potencial para a criação de Geoparques, objetivando a exploração econômica das áreas de ocorrência e sobretudo sua preservação ambiental. Apesar de reconhecido, esse potencial ainda é muito pouco explorado no território nacional.

Dentre as iniciativas de destaque temos o Parque Pedra da Cebola, localizado no Bairro Mata da Praia em Vitória no Espírito Santo. A Pedra da Cebola recebe esse nome em função de seu aspecto “descamado” similar às palhas de uma cebola. Trata-se de um granito porfirítico (Granito Vitória) que apresenta matriz de granulação média e coloração acinzentada.

Vista Geral do Parque da Pedra da Cebola em Vitória – ES, nota-se os jardins e a Pedra da Cebola ao fundo com seu aspecto “descamado”. Fonte: Ana Paula de Oliveira

O Parque constitui uma das principais áreas abertas à visitação pública em Vitória e conta com uma ampla gama de atrações, playground, pistas para caminhada, jardim oriental, mini zoológico, áreas dedicadas às práticas esportivas e um Centro de Educação Ambiental voltado a práticas pedagógicas que buscam estimular a reflexão e o aprendizado de temas ambientais.

Outro importante exemplo no território nacional é a Pedra Chapéu do Sol que se localiza na região norte do Município de Cristalina, no Estado de Goiás, mais precisamente na porção central do Domo de Cristalina. Trata-se de um gigantesco monólito de quartzito que pesa aproximadamente 350 toneladas e possui cerca de 13,7 metros de comprimento, sendo datada em 1.2 bilhões de anos. O bloco possui um alinhamento de seu eixo principal na direção N-S e uma inclinação de aproximadamente 10o, sendo uma das principais atrações turísticas do estado. Vale destacar que no imaginário popular a pedra seria a responsável por “manter o equilíbrio” do mundo.

Pedra Chapéu do Sol. Fonte: Clodoaldo Lemes

Referências

Rabassa, J. ; Martínez, O. ; Colman, C. ; Ladeira, F.S.B. ; Sarubbi, Y. The Piedra Movediza (“Rocking Stone”) of Tandil (Province of Buenos Aires, Argentina) and The “Piedras Equilibristas” (“Balancing Rocks”) of Paraguay and Brazil. In: Pablo Bouza; Jorge Rabassa; Andrés Bilmes (Orgs). Advances in Geomorphology and Quaternary Studies in Argentina: Proceedings of the Seventh Argentine Geomorphology and Quaternary Studies Congress. Springer, v.1, 2021, pp. 219-243.

Silva, A. F. ; Gonçalves, S. L. ; Machado Filho, L. Geoparque e Educação Ambiental no Parque Pedra da Cebola. In: 49º Congresso Brasileiro de Geologia, 2018, Rio de Janeiro – RJ. Geologia: Conhecer o passado para construir o futuro.

Twidale, C. R. Granitic Landforms. Elsevier, Amsterdam, 1982. 372p.


Texto: César Henrique Bezerra de Farias

Edição: Diego F. T. Machado

Foto da capa: CHON KIT LEONG/ALAMY STOCK PHOTO


São Paulo antes dos Tupi: a ocupação humana e ambientes de 10mil anos atrás

por: Pedro M. Cheliz –

Com hábitos nômades e vivendo em pequenos grupos, estes antigos habitantes viveram em um tempo caracterizado por importantes mudanças ambientais.


Muitas vezes se diz que o Brasil e o Estado de São Paulo são uma terra antiga habitada por um povo jovem. Outros lembram que a gente que vive nesta terra não é tão nova, pois quando os colonizadores portugueses desembarcaram no Brasil, o território já era há muito ocupado por diversificados povos indígenas agricultores e ceramistas. Com menos frequência se lembra, porém, que antes dos indígenas Tupi e Jê, o atual território brasileiro foi ocupado por seus possíveis ancestrais, que praticavam um modo de vida distinto, num tempo tão distante do atual, que a própria Terra se apresentava de maneira diferente da de hoje, mais de 8 mil anos atrás.

As evidências da presença humana neste tempo distante no estado de São Paulo são pouco comuns, restritas a restos de pouco mais de dez antigos assentamentos, espalhados ao longo de diferentes pontos do atual território paulista. Nestes locais foram encontrados, em profundidades que por vezes excedem 3 metros, antigas ferramentas e outros vestígios de presença humana, próximos a fragmentos de carvão ou amostras de areia cujas análises em laboratórios apontam idades que chegam a ser, em alguns deles, superiores a 10 mil anos atrás.

Diversidade dos ambientes de ocupação

Tais antigos vestígios de presença humana mostram-se presentes em diferentes domínios da natureza – dos fundos de estreitos vales profundos das íngremes serras florestadas do atual litoral no extremo leste paulista, aos terrenos de declives suaves nas margens dos rios Paranapanema e Grande, no extremo oeste do estado. Apresentando-se também em meio às escarpas rochosas que marcam o centro do Estado, próximos a atuais centros urbanos do interior, como Brotas, Rio Claro, São Carlos e Araraquara. Muitos dos turistas que se dirigem a tais áreas, atraídos pelas frescas cachoeiras de seus grandes paredões rochosos, sequer desconfiam que estão se banhando próximos a alguns dos registros de ocupação mais antigos de São Paulo e do Brasil.

Algumas características dos antigos agrupamentos humanos

O estudo destes antigos vestígios da presença humana pelos arqueólogos sugere que eles são produtos de povos humanos que viviam em grupos pequenos, de algumas dezenas de pessoas, e que praticavam um modo de vida nômade ou seminômade, vivendo da caça e da coleta. Dentre tais vestígios, os mais numerosos são artefatos de pedra lascada, tais como belas pontas de projéteis criadas a partir do trabalho humano sobre rochas e quartzos translúcidos, possíveis armas ou ferramentas cerimoniais ou de caça.

Alguns dos artefatos de rocha lascada encontrados em sítios arqueológicos líticos antigos de São Paulo. Foto: acervo pessoal

Também foram identificados, em menor número, antigos sepultamentos, incluindo um esqueleto encontrado em meio a um bolsão de argila e com pontas de projéteis em suas mãos. “Luzio”, o nome pelo qual foi chamado, em referência à “Luziado povo de Lagoa Santa em Minas Gerais, foi encontrado no fundo de um vale das serras do Vale do Ribeira, e datado em cerca de 9 mil anos atrás.

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Crânios de Luzio (à esq.) e de Luzia, ambos com idades semelhantes, do Holoceno Inicial. Eduardo Cesar e laboratório de estudos evolutivos humanos / ib-usp – Reprodução – Pesquisa Fapesp

A capacidade de se adaptar frente as adversidades do meio

Estas antigas evidências da presença humana comumente encontram-se mesclado a argilas, areias, cascalhos, solos e grãos de polens que indicam que esse povoamento ancestral lidou com ambientes, climas, biomas e paisagens bastante diferentes dos atuais. Essas diferenças incluem um clima mais seco do que o dos nossos dias, uma menor presença de florestas e mais comum vegetação de campos abertos e arbustivas, com os rios e mesmo o mar estando então em posições significativamente diferentes das atuais.

Tais evidências do meio físico e biológico sugerem, ainda, que estas antigas populações viveram em um tempo caracterizado por importantes mudanças ambientais, o que possivelmente colocou à provas o modo de vida e a resistência destes antigos habitantes do estado de São Paulo. Tais grupos humanos, porém, parecem ter mostrado elevada capacidade de se adequar a tais mudanças do meio, já que alguns destes antigos assentamentos indicam a presença destes antigos caçadores e coletores ao longo de intervalos de tempo que excedem 3 mil anos (tais como nos sítios Caetetuba e Bastos).

Conhecer, compreender e valorizar!

Os conhecimentos que se tem hoje sobre este distante tempo de ocupação se devem às pesquisas efetuadas por diversas universidades estaduais e federais, e grupos de estudos independentes. Os acervos resgatados nas escavações em tais antigos sítios arqueológicos encontram-se espalhados em várias instituições e museus do estado, em geral pouco conhecidos do público. A lembrança da triste tragédia do Museu Nacional consumido pelas chamas destaca a urgência de darmos mais atenção ao tema e acompanhar a condição de preservação destes importantes acervos, para evitar que ocorram eventuais novas e irreparáveis perdas.


Saiba mais

O Homem de Capelinha – A descoberta mais antiga de um fóssil do Estado de São Paulo. – Parque Estadual do Rio Turvo

Bibliografia

Artigo científico

ARAUJO, Astolfo Gomes de Mello, CORREA, Leticia Cristina. FIRST NOTICE OF A PALEOINDIAN SITE IN CENTRAL SÃO PAULO STATE, BRAZIL: BASTOS SITE, DOURADO COUNTY. Palaeoindian Archaeology. Volume 1 Número 1. 2016

CHELIZ, Pedro Michelutti; de SOUSA, João Carlos Moreno; MINGATOS, Gabriela Sartori; OKUMURA, Mercedes; ARAUJO, Astolfo Gomes de Mello. A ocupação humana antiga (11-7 mil anos atrás) do Planalto Meridional Brasileiro: caracterização geomorfológica, geológica, paleoambiental e tecnológica de sítios arqueológicos relacionados a três distintas indústrias líticas. Revista Brasileira de Geografia Física v. 13 n.6. 2020

Dissertação de mestrado

SANTOS, Fabio Grossi. Sítios líticos no interior paulista: um enfoque regional. Dissertação de mestrado. USP.


Texto: Pedro Michelutti Cheliz

Edição: Diego F. T. Machado


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A ocupação humana remonta a intervalos de tempo em que a configuração do meio físico (tais como o relevo, sedimentos, rochas, rios e solos) nem sempre foi semelhante a atual. Estas diferenças se tornam tão mais intensas quanto mais antigos são tais intervalos de presença humana. Desta maneira, pesquisas que busquem estudar intervalos pretéritos da presença antropica devem levar em conta pesquisas como as desenvolvidas nas áreas de geomorfologia, pedologia, sedimentologia e estratigrafia que busquem estimar tais variações do meio físico ao longo do tempo. Visando discutir tais temas, convidamos os professores Astolfo Araujo (Museu de Arqueologia e Etnologia, USP) e Paulo Giannini (Instituto de Geociências, USP), para apresentarem um pouco dos trabalhos que vem desenvolvendo em áreas arqueológicas continentais e litorâneas do Brasil.

Artigo discute a influências de mudanças climáticas e hidrológicas na transformação das paisagens nos últimos 115 ka

por Pedro Cheliz –

O trabalho assinado por Pedro M. Cheliz e colaboradores aponta alternâncias entre climas úmidos e secos desde o Eemiano e questiona algumas relações estabelecidas entre altitudes de terraços, idades de depósitos e tipos de solos.


Acaba de ser disponibilizado na revista Quaternary International um novo artigo que discute as relações entre relevo, solos e depósitos em planícies fluviais, a partir de um estudo de caso na planície do rio Jacaré-Guaçu. O artigo aborda evidências de transformações ambientais e climáticas dos últimos 110 mil anos registradas nesta planície aluvial. Igualmente, ele caracteriza como mudanças na paisagem ao longo do tempo contribuíram para criar no local uma dissociação entre formas de relevo e materiais associados.



Ali, os terraços fluviais mais elevados vinculam-se a depósitos mais recentes (12-8 mil anos atrás) e paleosolos formados em condições de má drenagem (onde a água penetra e circula com dificuldade pelo perfil de solo).

Os terraços mais baixos e próximos a várzea, por sua vez, encontram-se associados a depósitos mais antigos (115-110 mil anos atrás) e  a paleosolos formados em condições de boa drenagem (onde a água penetra e circula com facilidade pelo perfil de solo), ainda que atualmente predominem neste local condições de má drenagem.

A área de estudo está localizada no Estado de São Paulo (Brasil), próximo à divisa entre os municípios de Boa Esperança do Sul e Araraquara

Estes padrões de conexões entre formas de relevo e materiais associados são diferentes dos usualmente registrados em planícies aluviais do sudeste do Brasil, onde os terraços fluviais são geralmente interpretados como vinculados a depósitos tão mais antigos e solos tão melhor drenados quanto mais elevados em relação ao nível do rio atual. De maneira que fortalece-se incertezas em relação a extrapolações frequentemente feitas entre altitudes de terraços, idades de depósitos e tipos de solos. Reforçando, assim, a necessidade de estudos geomorfológicos, pedológicos e cronológicos de detalhe em áreas pequenas em adição a pesquisas voltadas a caracterizar tendências dominantes de sistemas fluviais ao longo de áreas mais vastas.

Leia o artigo na íntegra: DOI: 10.1016/j.quaint.2021.06.016


Sobre o autor correspondente

Pedro M. Cheliz é graduado em Geografia e Geologia, e mestre em Geografia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), com cursos de formação complementar na área de arqueologia. Tem experiência profissional em consultoria e licenciamento ambiental, bem como como educador no ensino básico nas áreas de geografia, história e ciências, e no ensino superior nas áreas de geologia e geografia. Desenvolve atividades de pesquisa na área de Geociências e Geografia, atuando principalmente nos seguintes temas: geomorfologia, pedologia, planejamento ambiental e geoarqueologia. Vincula-se aos grupos de pesquisa do LabPed (Laboratório de Pedologia), NEAL (Nucleo de Estudos Ambientais e Litorâneos), IPEC (Instituto de Pesquisas Cananéia) e GEA (Grupo de Estudos de Arqueologia). Atualmente é bolsista de doutorado do CNPQ.

ResearchGateLattes – email: pedro.michelutti@gmail.com


Texto: Pedro M. Cheliz

Edição: Diego F. T. Machado


Publicações Acadêmicas do LABPED